Estudo
analisa mulheres e negras na educação brasileira
Date:
03/01/2017
Um
projeto desenvolvido entre 2014 e 2016 trouxe para o debate as políticas
educacionais no Brasil para a questão do gênero, com apoio do Comitê da América
Latina e do Caribe para a Defesa dos Direitos da Mulher (CLADEM), da
Comunicação em Sexualidade ECOS e do Geledés, Instituto da Mulher Negra.
Fonte: GGN
Uma compilação de artigos
aprofunda o desafio da educação e gênero no Brasil, a agenda para as políticas
educacionais, o contexto histórico das propostas políticas já ou não
implementadas, as mulheres negras na sociedade civil e no campo acadêmico, e
como a ONU analisa a educação brasileira.
A seguir, a descrição dos
artigos, reprodução de trecho da apresentação do documento:
Com o objetivo de tornar
conhecidos os propósitos e as ações do Projeto Gênero e Educação, a Introdução
deste livro apresenta as principais contribuições e o potencial articulador da
iniciativa em um contexto político bastante desafiante do país. Contexto no
qual a questão de gênero vem sendo objeto de disputas acirradas com grupos
religiosos fundamentalistas e com outros grupos contrários às agendas de
direitos humanos – como o movimento Escola Sem Partido – no processo de
tramitação e implementação dos planos de educação nacional, estaduais e
municipais e no cotidiano de muitas escolas públicas do país.
Em seguida, Denise Carreira
aborda no artigo Informe Brasil – Gê- nero e Educação: da Conae às Diretrizes
Nacionais, as principais recomendações e desdobramentos deste que foi o documento
base do Projeto. Elaborado em 2011 e atualizado em 2013, sob responsabilidade
da Ação Educativa, o Informe foi desenvolvido no marco da Campanha por uma
Educação Não Sexista e Antidiscriminatória, coordenada pelo CLADEM.
Apresentado em 2011 ao Congresso
Nacional e no mesmo ano em audiência pública à Comissão Interamericana de
Direitos Humanos da Organização dos Estados Americanos (OEA), o Informe foi
atualizado em 2013 e constituiu uma das principais referências para os debates
ocorridos no processo que culminou na segunda Conferência Nacional de Educação
(CONAE), realizada em novembro de 2014, em Brasília/ DF. Com base na incidência
política articulada de vários movimentos sociais, a CONAE 2014 deliberou a
favor da construção de Diretrizes Curriculares Nacionais de Educação, Gênero e
Diversidade Sexual, uma das principais recomendações do Informe.
No artigo Contribuições da
produção acadêmica sobre gênero nas políticas educacionais: elementos para
repensar a agenda, Sandra Unbehaum e Cláudia Vianna apresentam um balanço
crítico sobre a agenda de gênero nas políticas educacionais brasileiras, tendo
por base a produção acadêmica desenvolvida sobre esse tema entre 2000 e 2015.
O material examinado contempla
102 produções acadêmicas dedicadas (artigos, dissertações de mestrado ou teses
de doutorado), das quais 95 foram divulgadas a partir de 2001 (Vianna, 2011).
Dessas, 34 foram elaboradas entre 2007 e 2009 e 31 entre 2010 e 2015. No texto,
é identificado o crescimento da pesquisa acadêmica sobre a temática de gênero e
da diversidade sexual nas políticas públicas de educação, sobretudo a partir de
2008. As autoras retomam as recomendações do Informe Gênero e Educação (2011,
2013), para discuti-las com base nos achados do balanço crítico sobre a
produção acadêmica.
No artigo Mulheres negras na
educação: desafios para a sociedade brasileira, Suelaine Carneiro aborda a
participação das mulheres negras no sistema de ensino. A autora trata das
desigualdades educacionais entre as mulheres brasileiras, identificadas como um
dos desafios da agenda de gênero no Informe Brasil – Gênero e Educação, em
especial as desigualdades que impactam a trajetória educacional das mulheres
negras, decorrentes do racismo.
É apresentado um levantamento da
produção de informações e de conhecimentos sobre mulheres negras na educação
desenvolvida nas últimas décadas por universidades e organizações da sociedade
civil. Partindo do reconhecimento da atuação do movimento de mulheres e homens
negros ao longo da história brasileira – no qual a educação sempre ocupou um
lugar de destaque –, identifica-se que a produção sobre mulheres negras e
educação avançou timidamente nos anos de 1990 e ganhou fôlego a partir de 2003.
De forma crítica, a autora observa que tal produção, comprometida com uma
abordagem interseccional entre gênero e raça, ainda está pouco refletida nos
periódicos de educação e, inclusive, nos periódicos acadêmicos com foco em
estudos de gênero e feminismo.
No artigo A educação brasileira
na ONU: temas e debates nos relató- rios do Brasil ao Comitê CEDAW, Ingrid Leão
trata das ações a favor do direito à educação indicadas à ONU pelo Brasil, com
atenção a educa- ção de meninas e mulheres. O Comitê CEDAW é instância da ONU
responsável por acompanhar a implementação dos direitos humanos das mulheres à
luz da Convenção para a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a
Mulher – CEDAW (sigla em inglês), aprovada em 1979.
O levantamento teve como
referência as informações prestadas pelo Estado brasileiro nos relatórios oficiais
ao Comitê CEDAW no período de 2003 a 2012. Em consonância com o Informe Brasil
– Gênero e Educação (2011, 2013) e com base na análise desses relatórios, a
autora apresenta as mudanças ocorridas nas políticas educacionais nas últimas
décadas e chama a atenção para a necessidade que a agenda da igualdade de
gênero na educação seja abordada pelo governo brasileiro em sua complexidade,
como políticas de gênero, indo além de políticas limitadas às mulheres e
referenciadas no maior acesso e no melhor desempenho delas na escolarização.
No último artigo desta
publicação, Sylvia Cavasin retoma a experiência da Rede de Gênero e Educação em
Sexualidade (REGES), rede de advocacy impulsionada com o objetivo de
sensibilizar universidades, organizações da sociedade civil e órgãos
governamentais sobre a importância da inclusão da educação em sexualidade na
perspectiva das relações de gênero nos currículos de formação inicial de
professoras e professores.
Como esforço de uma organização
de sociedade civil, a REGES foi criada em 2009 pela ECOS – Comunicação em
Sexualidade, com o apoio da Fundação Ford, da Organização das Nações Unidas
para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO) e do Fundo de População das
Nações Unidas (UNFPA). Teve como base a pesquisa As Políticas de Educação em
Sexualidade no Brasil 2003 a 2008, desenvolvida pela ECOS. No artigo, a autora
destaca a importância do fortalecimento da REGES visando a manutenção das
conquistas das últimas décadas em educação em sexualidade.
Considerando todos os desafios colocados
neste momento político, mais do que nunca, as organizações coeditoras desta
publicação ressaltam a necessidade estratégica de aproveitar o momento
conflitivo e polêmico de disputa de projeto de sociedade que o país atravessa
para ampliar e pluralizar a roda de debates e fortalecer as alianças políticas
em prol da igualdade de gênero nas políticas educacionais, traduzindo seus
impactos no cotidiano das escolas e da vida em sociedade. É fundamental
construir e atravessar “pontes”, além de somar forças com todas e todos aqueles
comprometidos com democracia, justiça social e direitos humanos no país.